O Mundo De Malory

Thomas Malory foi o autor do livro Le Morte D'Arthur (publicado por William Caxton em 1485, como disse no post anterior). A pesquisa que fiz para o post sobre armaduras me rendeu umas horas passeando pelo texto do livro, e reparei alguns detalhes interessantes. Uma das coisas que mais me chamou a atenção, foi o comprimento e abrangência dos títulos. Por outros textos que caíram na minha mão, vejo um padrão comum nisso, nos títulos que não se destacam pelo poder de síntese, pelo contrário, buscam contar a maior quantidade de detalhes possíveis, mesmo que o texto seja curto. Este costume se manteve por séculos, tanto é assim que o Quixote, publicado em 1605, ganhou o nome de "El Ingenioso Hidalgo de Don Quijote de La Mancha".
Ambos livros nutrem semelhanças na construção dos títulos e formatação dos capítulos; eram capítulos curtos que não passavam de poucas páginas, com títulos que equivalem aos trailers de cinema de hoje, contando praticamente o desfecho das histórias.

Exemplos:

Quixote, Capítulo VIII
Del buen suceso que el valeroso Don Quijote tuvo en la espantable y jamás imaginada aventura de los molinos de viento, con otros sucesos dignos de felice recordación

Quixote, Capítulo XVII
Donde se prosiguen los innumerables trabajos que el bravo Don Quijote y su buen escudero Sancho Panza pasaron en la venta, que por su mal pensó que era castillo

Le Morte, Livro Primeiro, Capítulo XXI
How Ulfius impeached Queen Igraine, Arthur's mother, of treason; and how a knight came and desired to have the death of his master revenged

Le Morte, Livro Terceiro, Capítulo V
How at the feast of the wedding of King Arthur to Guenever, a white hart came into the hall, and thirty couple hounds, and how a brachet pinched the hart, which was taken away

Foi assim que nasceram os spoilers??? Hein?

Deixando isso de lado, Malory deu dimensão a um sem fim de personagens. É gente demais para conseguir acompanhar, e ter compreensão do todo. Muitos cavaleiros, muitos castelos, florestas, paisagens, buscas e muitas batalhas (e muitas vezes repetindo o roteiro da batalha, àla Ctrl+C / Ctrl+V).

Um monte de Thomas

O grande mérito do Malory foi o esforço em compilar estas histórias, e muitas vezes escrever o nexo entre elas, inexistente nas versões originais. É relativamente aceito que Malory já tinha falecido quando a edição de Caxton veio à tona; Caxton, assim como muitos editores fazem até hoje, se preocupou em compilar o texto que tinha em mãos, mas praticamente não ou revisou. Tem vários capítulos que visivelmente não estão no seu formato definitivo, deixados assim propositalmente pelo autor para dar continuidade posteriormente. A mesma falta de cuidado aparece em alguns capítulos que começam no meio de uma frase qualquer. Se sabe que o último capítulo do último livro é incompleto, onde Arthur chegaria à ilha de Avalon após sua batalha com Mordred.

Assim como Caxton, teve outros editores tão ansiosos quanto descuidados, que pegaram o trabalho dele e republicaram sem uma revisão apropriada. Aparentemente, os manuscritos de Malory sumiram com Caxton, e as subseqüentes edições parecem baseadas no trabalho do imediato predecessor. Assim, Wynkyn de Worde lançou a sua em 1498 e 1529, William Copland em 1559, Thomas East em 1585, e Thomas Stansby em 1634. Esta última edição foi reimpressa em 1816 e 1856, a última editada por Thomas Wright. Sim, pelo jeito Thomas era um nome bem comum, mesmo se passado 400 anos.
Para variar um pouco na temática, em 1817 Robert Southey voltou para o texto de Caxton, embora pegou umas 11 folhas do texto de Wynkyn para completar o trabalho. Em 1868, Sir Edward Strachey apresentou uma reimpressão do texto de Southey, porém traduzido para o inglês atual, subtituindo palavras obsoletas, e suavizando passagens para "evitar problemas em caso de cair nas mãos de crianças incautas", como ele mesmo descreveu. Em 1889, o Dr. H. Oskar Sommer expôs o texto de Caxton página por página, com uma completa discussão sobre as origens usadas por Malory. Mais tarde, em 1897, Mr. Israel Gollancz trouxe uma bela edição, seguindo os princípios de Strachey sobre modernização da língua, mas recuperando frases omitidas por ele.
Sobre a edição que tenho em mãos, o responsável por voltar às origens é John Matthews; a pesquisa acima é de A.W. Pollard, quem sem querer tirar o mérito de Wynkyn, se esforçou em separar o texto de Caxton das modificações introduzidas por Wynkyn nos originais. O trabalho de indexação, como conhecemos hoje, é obra de Mr. Henry Littlehales.

Baita livro.

A imagem no começo do post é da capa da edição que faz parte da minha humilde biblioteca, edição ilustrada por Anne-Marie Ferguson. As ilustrações dela merecem um post à parte, quem sabe o próximo...


2 comentários:

Pedrita disse...

gostei do post e muito bonita a capa do livro. eu acho muito interessante os itens que compõe as tradições e definem nobreza. beijos, pedrita

Anônimo disse...

Interessante essa coisa dos títulos. Eu nunca prestei a devida atenção a títulos de capítulos, mas vou ser mais atenta pra ver se descubro algum padrão também, nunca me passou pela cabeça que até títulos poderiam ser influenciados pela sua época.

E faz um post sobre os desenhos sim, são maravihosos! Se algum dia seu livro cair no chão, sou eu cobiçando, tá? hehehe

Ahhhh fiz meu chimarrão. Apanhei um pouco e acho que coloquei erva demais, porque a cada três goles a água acaba, hahahaha... mas um dia eu aprendo... http://img.photobucket.com/albums/v257/fotosre/blog/IMG_9707.jpg

Beijos!