As Ilustrações do Malory

O texto abaixo acompanha o livro do post anterior, e reflete os pensamentos da artista Anna-Marie Ferguson sobre seu trabalho nas ilustrações e pinturas feitas para enriquecer o texto de Malory com sua visão particular das cenas épicas relatadas nos contos. São ao todo mais de 60 ilustrações em diferentes estilos, todas impressas em página inteira. Com vocês, Anna-Marie Ferguson:

É uma honra terem me confiado o trabalho de ilustração, e em muitas formas o épico de Malory é o sonho de qualquer desenhista. Esses livros que misturam história e lenda tem grande atração entre os artistas, e no caso de Malory a beleza extraordinaria tanto em imagens quanto emoções seduziu tantos ao longo do tempo que deixou um legado na arte que poucos livros podem rivalizar. Os artistas Pré-Raphael vem imediatamente à mente na longa lista de devotos do Malory, mas infelizmente e por questões práticas somente podemos dar uma curta resenha das ilustrações. Existem três edições prévias do Malory ilustradas. A primeira foi impressa pelo sucessor de Malory, Wynkyn de Worde em 1498, seguido por William Copland em 1557 e Thomas East em 1585. Os três foram ilustrados com xilogravuras de autores desconhecidos, cada edição de certa forma emprestando seus desenhos para a próxima. Malory não teria novos ilustradores pelos próximos 300 anos até que Aubrey Beardsley veio à fama com sua edição de 1893, publicada por J.M. Dent. Embora seu trabalho sobre o Malory recebeu algumas críticas, é sem dúvida merecedor de destaque pelo seu estilo revolucionário de ilustração; seu estilo é influência para outros até os dias de hoje. Seguindo Beardsley veio o excelente aquarelista Sir William Russel Flint com sua edição publicada pela Medicy Society 1910-1911. Considerado seu melhor trabalho, duas das suas ilustrações do Malory foram parte do acervo dos museus Victoria e Albert. O texto de Caxton encontra-se novamente com ilustrações em preto e branco nas xilografias de Charles Gere para a impressão de Ashendere em 1913, e com Edward Bawden para a Folio Society de Londres em 1982. A irmandade de ilustradores de Malory nunca parou de crescer junto com as numerosas adaptações e citações do texto. Essa lista abriga grandes nomes como Arthur Rackman e Walter Crane, assim como Howard Pyle e N.C. Whyte. Sobre o convite para falar da ilustração de Malory, só posso fazê-lo desde uma perspectiva pessoal, já que infelizmente pouco é conhecido da experiência de outros autores. Esta é uma rara oportunidade, embora curta, de levar o leitor para excursões para as florestas medievais de Malory onde os ilustradores perambulam, espiam e coletam suas visões. Uma das recompensas em ilustrar Malory é viver no seu cenário, passear entre seus dramas em companhia dos fantasmas de reis lendários. É a diferença entre estudar Malory e vivenciá-lo. Por exemplo, poucos (com exceção do autor) perguntariam para Morgana se preferiria levar uma cota de malha em uma missão perigosa, ou se Merlin ainda tem qualquer dente com sua idade. Embora pode ser muito divertido para um ilustrador se deliciar no texto de Malory, o peso de um clássico carrega uma grande responsabilidade, mais pesada ainda dada sua importância como fonte de identidade cultural británica. Por este motivo, deve-se tomar cuidado especial ao revisitar visões clássicas (A Távola Redonda, Excalibur, etc.) e fornecer novas imagens, mas dentro do contexto tanto do texto como da tradição. Um exemplo recai na ilustração de Merlin e Nimue, que é uma nova (ou muito antiga) visão do descanso final de Merlin. Relembra os túmulos neolíticos da Britania, e a maravilha que Merlin mostra para Nimue estaria nas gravuras que decoram estas pedras. Haveria algum lugar melhor para capturar ou para o descanso eterno de um personagem como Merlin? A pintura sugere mais pensamentos, aos quais o texto não se opõe. A lente particular do artista pode também trazer novos sentimentos para cenas já bem conhecidas. A linha sutil de comédia sobre o destino de Lancelot como "prisioneiro do prazer" das quatro belas rainhas é um caso. Todas as diferentes raízes da tradição arturiana culminam em Malory. Podemos ver os padrões heróicos lendários comuns à lenda celta como base dos ideais da cavalaria medieval, os romances franceses e a busca cristã do Graal. Quando achei propício, incorporei elementos que permeiam a origem particular de uma lenda específica. Na pintura das três mulheres da fonte o resplandor azul que circunda as figuras é a lembrança de suas origens em outro mundo como a trindade divina da tradição celta. O ilustrador também tem um papel como contador de histórias, muitas vezes dizendo aquilo que o escritor deixou de dizer. Além da Britania, Le Morte d'Arthur é uma história que pertence ao mundo no seu poder mítico para dramatizar o ciclo da vida. Na camada emocional, há poucos lugares onde Malory não possa enviar um ilustrador. É um livro barulhento: cómico, brutal, tenro, de quebrar o coração e tirar o fôlego. Há mistérios nos remanescentes de sabedoria de uma era, difíceis de filtrar através da linguagem e em conseqüência de serem falados através do simbolismo. O ataque doloroso que fere o Rei Pèlles, que ocasionou as terras áridas e obviamente a conquista do Graal fazem parte do reino de um artista visionário. Como terrenos sagrados, são talvez os mais desafiadores e sublimes temas dentro do Malory. As aquarelas e desenhos desta edição vieram da imaginação, as vezes auxiliados por um modelo. A intuição serviu como guia, e em umas poucas ocasiões foram derivadas de sonhos. Assim foi o caso da "obtenção de Excalibur", que apareceu e persistiu até completar uma das primeiras edições. A superstição pode ter sido um fator para minha decisão de pintar a cena uma segunda vez, mas logo pude apreciar a razão no gesto do mágica do Merlin, e tudo ganhou lugar na sua sombra. O Malory é ambicioso, e raramente permite ao seu ilustrador um descanso ou uma cena fácil. Para mim estes dois anos que se passaram foram um verdadeiro trabalho de amor. Quando perdia o rumo nas florestas pela demanda das variadas buscas, ouvia a batida de uma antiga lenda que corria como um rio sob as veias de um romance. É o que acredito ser a fonte da mágica que permeia os cenários de Malory, encapa seus personagens e intoxica um ilustrador. É um privilégio ter servido um mundo tão belo... tão belo e acidentado.
Anna-Marie Ferguson
Alberta, Canada, 2000


Saibam que a mente de um artista funciona no seu próprio ritmo, e por esse motivo varias partes do texto precisaram de uma tradução literal, sem muita compreensão do texto nem no original e por vezes confuso no próprio português. Não coloco isso como minha falha em interpretar o texto; acredito que a Anna-Marie realmente teve dificuldade em expressar o que sentia em palavras, já que sua arte é outra.

Mais sobre Malory na semana que vem... até!

2 comentários:

Anônimo disse...

eu adoro ilustrações em livros, acho que dão movimento aos textos. tb adoro ver a visão que o ilustrador tem do que leu, que nem sempre é a mesma que a minha. parece ampliar as percepções da leitura e dar novas formas e cores. adorei o post. beijos, pedrita

Anônimo disse...

Gostei do texto. Apesar de eu ser um zero à esquerda pra ilustração e desenho, deu pra entender a sensação dela ao ilustrar Malory, o porquê dela achar isso uma honra. A obra é vasta e imponente, dando ao mesmo tempo liberdade e responsabilidade. E é o tipo de obra que pode ser ilustrada mil vezes, cada um vai ter uma visão diferente da história.
Bjos!