Ah, Mulheres... e seus castelos

Achei o castelo, e não foi no google maps. Embora para ser sincero, até que poderia ter achado no google maps mesmo; o tal do castelo das mulheres não é outro que o castelo de Edinburgh.

O assunto é extenso, mas melhor assim; tenho muita coisa para contar hoje. Claro que não li tudo hoje nem muito menos pesquisei apenas hoje, mas foi o trabalho de uma semana. Espero curtam ler como eu curti escrever, onde tinha horas que ria sozinho...

Achei!

(Tirado do "Eleven Old French Narrative Lays") Edinburgh foi reconhecido logo cedo como o Castelo das Mulheres, tanto é assim que em 1142 o rei David da Escócia começou a utilizar este nome, Castrum ou Castellum Puellarum nos seus mapas em vez de Edenburge.
O Castelo das Mulheres foi mencionado por Geoffrey de Monmouth no Historia Regum Britanniae (classicão arturiano de 1135), e por Wace na sua tradução deste trabalho, no Roman de Brut:

E el mont Agned chastel fist / Qui des pucelles ad surnun.

O castelo teve upgrade para a categoria "lendário" nas mãos de Geoffrey, ao colocá-lo no papel de um lugar místico, ou mesmo como refugio, como apareceu nas continuações do Perceval (Wally explicando: O Perceval de Chrétien de Troyes ficou inacabado pela morte do autor, e outros escreveram vários finais. Esse conjunto de obras é conhecido como "Perceval Continuations"). O castelo aparece também no Le Bel Inconnu, Fergus, Yder, e no Queste del Saint Graal.

(Tirado agora do Sir Gawain) Inicialmente, é interessante perceber que o nome do castelo onde a dama é mantida refém é Castellum Puellarum (Castelo das Mulheres), que é um nome antigo de Edinburgh, como aparece nos documentos de 1142 (e assim Wally prova que consulta mais de uma fonte!). Edinburgh era a capital de Lothian, onde Loth e Anna governavam. Isso fez Anna a "Lady of Lothian", que em outras histórias aparece como Morgain, ou mesmo Morcades. A confusão entre estes personagens fez com que o conto da dama sitiada no castelo (o conto lindo, aliás), que originalmente era da Morgain, foi transferido para Anna, ou até mesmo para a mãe de Gawain, da qual nem se sabe o nome. Chegou a tal ponto que Morgain e Anna já foram identificadas como mães de Gawain.

Um tal professor Loomis escreveu um artigo para a Sociedade de Antiquarios da Escócia em 1955, onde se fala um pouco mais de evidências da relação entre Edinburgh e o Castelo das Mulheres. Vou copiar apenas um trecho que achei bacana. Ele se baseia no Lai de Doon do século 13, que identificou o Chateau des Pucelles como Daneborc, um nome antigo de Edinburgh. Olha só:

Nós sabemos que a senhora do Castelo das Mulheres era Morgana a Fada. Também sabemos que teve vários amantes e pelo menos dois maridos, dos quais um deles era o rei Lot de Lothian. Como rainha de Lothian, Morgana podia se hospedar em vários castelos com suas damas de companhia, mas nenhum seria mais apropriado que a fortaleza de Edinburgh. Considerando sua relação com Lot, e questão de lógica que Edinburgh e o Castelo das Mulheres se tratam do mesmo lugar.

No Conto do Graal de Chrétien, Gawain visita novamente um tal de Castellum Puellarum onde ele encontra Igraine e Morcades, e também sua mãe e avó, e resgata todas elas. Um pouco mais adiante no mesmo texto, Perceval (o herói do conto) resgata uma dama chamada Blanchfleur do castelo Belrepair, castelo que aparece no Enfances de Gauvain e nos textos posteriores em Inglês de Arthour e Merlim como o castelo onde Morgana se hospeda para dar a luz.

Agora sou eu quem fala, sem referências: o conto de amor entre Brancaflor e Perceval é lindo mesmo, e é o mesmo conto que mencionei acima. Vou falar alguma hora dele, preciso ler de novo.

Agora vamos ao que interessa, o papel lendário do castelo! Vou me basear nos textos de Malory, por ser o material ao qual tinha mais fácil acesso tanto para leitura como para pesquisa, tanto em papel quanto digital.

O Escudo de Galahad
Livro XIII, Capitulo 9 em diante

Depois do surgimento de Galahad no lance do assento perigoso e a busca do Graal como consequencia da visão do mesmo na távola redonda, os cavaleiros partem cada um para um canto. Galahad chegou na abadia branca após 4 dias cavalgando sem encontrar nenhuma aventura.Nesta abadia encontrou o Rei Bandemagus e Uwaine, que estavam lá pela aventura do escudo: um escudo que homem nenhum poderia erguer por cima da cabeça sem se machucar gravemente, morrendo em 3 dias. Eis que oportunamente o Galahad estava sem escudo, e decidiiu pegar logo este escudo. Afinal, cavaleiro perfeito é para essas coisas, esnobar dos outros por exemplo.

O tal escudo era branco, branco como neve segundo o conto, e no meio dele havia uma cruz vermelha. Foi assim que esta imagem cristã foi associada ao Galahad, reafirmando a teoria do cavaleiro perfeito, e o único que encontraria o Graal.

Não vou nem entrar nos detalhes exagerados clássicos da influência da Igreja na lenda arturiana, mas basta dizer que a cruz vermelha foi pintada com o sangue que escorria do nariz do Jose de Arimateia quando estava no leito de morte. Ve-se-pode-uma-coisa-dessas.


Ao Castelo!
Livro XIII, Capitulo 14 em diante

O título deste capítulo é curto e singelo como os outros:

HOW SIR GALAHAD DEPARTED, AND HOW HE WAS COMMANDED TO GO TO THE CASTLE OF MAIDENS TO DESTROY THE WICKED COSTUM.

É bem spoiler, mas nos contos arturianos não rolam surpresas, afinal, quantas vezes já foram contadas? Bom, o Galahad partiu para onde as aventuras o levassem, e acabou chegando a um lugar "ou" castelo chamado Abblasoure. Juro pra vocês que no conto diz exatamente isso: lugar ou castelo. Aí o Galahad viu que não se rezava missa (coisa meio impossível na época), então procurou até achar uma capelinha que estava ruindo, e entrou nela pra rezar. Nela, enquanto estava choramingando porque não tinha escutado missa, ouviu uma voz que disse para ele: "Vá até o castelo da damizelas, e acaba com o costume esquisito". Pelo menos, é o que entendo por wicked costum, que é o nome do capítulo.

Aí ele cavalgou um pouco, onde encontrou com algumas pessoas que lhe disseram para não ir no castelo, que ia morrer, etc, etc, é que tinha 7 cavaleiros que agora mantinham um costume impróprio. Ele foi assim mesmo, deu uns berros, lutou com todos e os perseguiu até entrar atropelando no castelo mesmo, e foi lutando com todos, liquidando um a um; os que não conseguiu matar fugiram.

Dentro do castelo veio uma moça que trouxe um berrante de mármore, que ele assoprou, e foi ouvido em duas milhas ao redor do castelo. Logo depois chegou um padre, que contou para ele a história direito: 7 anos atrás, chegaram estes 7 cavaleiros, que por cobiça mataram o duque Lianour (governante dessas terras) e seu filho mais velho, e tomaram para si o castelo e as filhas do duque. A filha mais velha teve uma premonição,e falou que eles não ficariam muitos anos, e seriam abatidos por um cavaleiro só. Por este motivo, os cavaleiros trancaram o castelo e não deixaram nunca mais entrar cavaleiro nenhum, e aquele que tentasse era morto mesmo antes de chegar na entrada. E assim que barbarizaram forçando todos os moradores do castelo a roubar e pilhar, pois não sobraram cavaleiros para impor a ordem. Sem homens para entrar, apenas as mulheres entravam, mas sem sair mais do castelo. E assim o castelo ganhou o nome de castelo das mulheres, porque devorava para si toda mulher que passase por seus portões.

Galahad perguntou pela filha do duque, mas ela foi morta 3 dias depois que os cavaleiros entraram; eles mantiveram a irmã mais nova, e outras jovens em grande sofrimento. Renderam homenagens à filha do duque, e pela manhã chegaram no castelo Gawain, Gareth eUwaine, e Galahad contou sua aventura, que acabei de contar para vocês.

Gostaram? Agora começa a busca por assunto para o próximo post... Até a semana que vem!


3 comentários:

Anônimo disse...

Humm qdo vc comentou do castelo das mulheres, não achei q seria um castelo q as aprisiona, achei q seria algum tipo de fortaleza cheio de girl power, rs.
e msm assim a mulherada entrava lá? tsc tsc...
Beijos!

Arthur Ferreira disse...

Oi Wally, olha só isso:

Estava eu tomando meu café e lendo o jornal, como nunca faço. Folheando as páginas, encontrei uma matéria falando sobre Endimburgo e seu castelo. Coincidentemente ou não, tinha uma manchete muito peculiar, me arrancando a atenção bruscamente, "Pedra é o centro das atenções no castelo".
Tratava-se da "Pedra do Destino", localizada (atualmente) na sala da coroa real, onde, por séculos os reis escoceses eram coroados (por sobre a pedra). Maso mais interessante está por vir: em 1296, Edward 1°, da Inglaterra, roubou a rocha e a levou para a abadia Westminster. Lá passou a ser usada na coroação dos rei ingleses.
A pedra só foi devolvida à Escócia em 1996, e em caso de nova coroação, ela é levada a Inglaterra.

Seria essa as origens da espada na pedra? A pedra que tornaria Arthur em rei? (Sem contar o detalhe da espada na pedra).

Abraços

Wally disse...

@Re: Bom, concordo que não é nenhum castelo da Disney... mas que é mais convincente para a época até que é. Eu achava (antes de estudar) que fosse um castelo regido por mulheres; digamos que por um evento qualquer (guerra, plaga, magia, etc) todos os homens do castelo estivessem afastados, e que algum dos cavaleiros da távola fizesse uma das proezas para que voltasse ao normal. Por isso que curto meu blog, é bastante educativo :-)
@ Arthur: Olha que tem muita gente que lê jornal ainda, mas eu também não tenho o hábito. Li sobre a pedra durante minha pesquisa, foi no site oficial do castelo; Inglaterra, Wales e Escocia sempre estiveram em conflito, e toda hora aconteciam essas trocas de poder, onde um invadia o outro e saqueava reliquias. A tal pedra na verdade é meio que um trono (não como o vaso, trono mesmo), e em a simbologia de começar o reino sobre pedra, para que seja duradouro e firme como a pedra mesma.
Valeu pelo comentário!
@ outros: Obrigado por ter lido! E fiquem a vontade para comentar da próxima vez!