O conto de Tristão e Isolda foi um dos romances de maior influência no período medieval. Sua importância é tal que inspirou a lenda arturiana, na história de Lancelot e Guinevere. Ambas as histórias são muito parecidas, salvando nomes e lugares, mas a influência do “Tristan” é indiscutível.
Originamente, a lenda do Tristan não tinha relação nenhuma com o Rei Arthur, mas logo depois do Vulgato (Lancelot-Graal em 1235), Tristan foi promovido a membro da Távola Redonda, por colocar assim.
Existem duas vertentes principais na lenda do Tristan. A primeira compreende os romances de dois poetas franceses da segunda metade do século 12, Thomas e Béroul, onde suas fontes se remontam até os antigos romances Celtas. A segunda vertente corresponde à prosa Tristan (1240), que é nitidamente diferente aos trabalhos prévios de Thomas e Béroul. A prosa Tristan virou a referência oficial para a lenda medieval de Tristan e Isolde, servindo de base para Thomas Malory. Só lembrando, Malory é o autor do Le Mort d’Arthur (1469).
Um pouco de história
Como disse acima, a primeira vertente corresponde a dois autores, Thomas e Béroul. Ambos os trabalhos parecem se sustentar em una história anterior, quem sabe a história original de Tristão e Isolda, mas nada sobreviveu que possa demonstrar isto. Como tantos originais, estes também se perderam no tempo.
O romance de Béroul é considerado a versão “descortês” ou mesmo “vulgar”, já que é menos refinada, e em várias cenas a atitude e ações dos personagens podem considerar-se brutais. Talvez esta história seja mais próxima da original, pela sua índole e base na lenda oral.
Já o conto de Thomas é um romance cortês. O autor escreve muito sobre os pensamentos e sentimentos dos personagens; embora a linha seja a mesma do Béroul, algumas passagens são diferentes.
Nenhum destes romances sobreviveu por inteiro. Do romance de Béroul, existe apenas um único manuscrito, que carece do começo e o fim. Do romance de Thomas existem várias cópias em diversos estados de conservação, nenhum deles inteiro, e juntando as partes ainda faltam segmentos no meio da história.
Chrétien de Troyes (sim, o eterno Chrétien de sempre) escreveu sua própria versão de Tristão e Isolda, da qual infelizmente nenhuma cópia sobreviveu até os dias de hoje. Este exemplar provavelmente ganhou o nome de “Mark e Isolda a Loura”; as provas da existência deste trabalho são as numerosas referências a ele em contos posteriores, como Erec et Enide e Clìges. Não há dúvidas de que Chrétien conhecia profundamente a história original.
Existem outros trabalhos como o do alemão Eilhart von Oberge, que escreveu Tristrant und Isalde (1170), trabalho este que foi usado para complementar partes faltantes do Béroul. Embora não existam cópias do original, sobraram referências ao trabalho dele que datam do século 13.
Entre os autores que se basearam no trabalho de Thomas, podemos mencionar o alemão Gottfried von Strassburg (Tristan und Isold – 1210), a saga escandinava Tristams Saga og Isonde (Séc.13) e o inglês Sir Tristrem (séc.14).
Eis que surge uma dúvida. Qual história conto para meus leitores? A primeira vertente, considerada original, ou a posterior, a versão em prosa? É inegável o valor da história original, porém no momento que considero o interesse e foco do meu blog, faz mais sentido falar da versão em prosa, ou mesmo da versão de Malory inclusa no seu Le Mort d’Arthur durante vários capítulos. Para não ficar no impasse, o melhor que posso fazer é um resumo da história original, e quem sabe daqui a alguns posts trazer o assunto à tona novamente para falar da versão arturiana.
Tristam et Yseult
Tristan, o filho da falecida irmã do Rei Mark de Cornwall, vai para Irlanda para receber os cuidados dos seus ferimentos, especificamente de uma ferida que não cicatriza. Esta ferida foi aberta com uma espada cujo gume foi embebido em veneno, e somente o talento de Isolda a Justa (filha de Isolda a Rainha) poderia curar estes ferimentos.
Quando Tristan volta para Cornwall, conta ao Rei Mark sobre a beleza de Isolda a Justa. O Rei Mark se encanta com o relato, se apaixona dela, e pede a Tristan que volte à Irlanda para pedir a mão dela no seu nome.
Tristan aceita esta missão, e a noticia é bem recebida no reino da Irlanda. Isolda a Justa aceita se casar com o Rei Mark, e Tristan e Isolda partem para Cornwall.
Isolda a Justa carregava com ela uma poção de amor, que usaria para garantir a fidelidade do Rei Mark. Inadvertidamente e por engano, Tristan e Isolda beberam a poção durante a viagem.
O resto da história relata como a culpa e o remorso perseguem Tristan e Isolda pela ambigüidade dos seus sentimentos; o conflito entre o que sentem com a fidelidade jurada a ao Rei Mark como legitimo e amante esposo dela, e como tutor e rei para Tristan, somada à desconfiança crescente do rei sobre os sentimentos destes dois.
Ambos foram exilados. Tristan conheceu outra Isolda, a da Mão Branca, com a qual quase desposou.
Eventualmente, Tristan recebe uma nova ferida mortal, que somente Isolda a Justa poderia sarar, mas ela está exilada na Irlanda. Ele pede socorro a ela, deixando como sinal entre eles que se ela concordasse em cuidar dos ferimentos dele, o navio do mensageiro enviado por ela usaria velas brancas. Se não concordasse, o navio teria velas pretas.
Isolda a Justa se comove, envia seu mensageiro em um navio com velas brancas, mas quando o navio chega a Cornwall, Isolda a da Mão Branca, roída de ciumes, manda dizer ao Tristan que as velas eram pretas. Ele finalmente morre desconsolado; e Isolda a Justa se suicida ao saber da morte de Tristan.
Assim termina o conto de 1150, que mais tarde inspiraria a prosa, que posteriormente daria lugar a sua versão arturiana no texto de Malory... que vai ficar para outro post.
Outros Meios, Outras MídiasO conto de Tristão e Isolda teve suas idas e voltas, sem nunca sumir do imaginário popular; isso talvez explique seu sucesso de público no meu humilde poll.
Richard Wagner, o famoso compositor de música clássica, deu o nome de Tristão e Isolda a um dos seus mais conhecidos trabalhos; uma ópera em 3 atos baseada principalmente no texto do Gottfried von Strassburg. Este trabalho foi escrito entre 1857 e 1859, com sua premiere em 1865 em Munique.
A última citação da qual tenho notícia e o filme Tristan + Isolde, de 2006. James Franco no papel de Tristan e Sophia Myles como Isolde nos presenteiam com um belo e entrosado casal, como a história faz questão de pedir. Grande destaque para Rufus Sewell no papel do rei Mark.
Vi este filme no cinema, e como vi gente sair chorando da sala... quem não viu, pode colocar na lista, vale a pena.
Então, isso é o que tenho para contar dessa vez sobre Tristão e Isolda... gostaram? Odiaram? Comentem!
Até a semana que vem!