Nas Terras do Rei Arthur - Parte 4

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No último post, estava saindo de Winchester, rumo a Salisbury. Existiam duas opções:

1) Voltar até Basingstoke, e pegar outro trem até Salisbury, ou
2) Ir até Southampton Central, e fazer baldeação para Salisbury.

A estação de Winchester tem duas plataformas, onde cada uma atende os trens conforme o sentido dos mesmos (ou seja, os trilhos ficam no meio, entre as plataformas). Olhei os horários dos trens e as baldeações, e dava exatamente na mesma ir por Basingstoke ou por Southampton, portanto fiquei na plataforma que estava e peguei o trem para Southampton Central. Acho que se mostrar o mapa dos trens fica mais fácil de entender.


Marquei com um pequeno quadrado as estações de Winchester e Salisbury. Eu podia recuar até Basingstoke (como se estivesse voltando para Londres), ou ficar na mesma plataforma que já estava e pegar o próximo trem até Southampton Central. Em ambos os casos, tinha que fazer uma baldeação para pegar um trem até Salisbury. Embora o mapa tem um monte de estações, peguei somente trens expressos, que param apenas em algumas estações principais. No mapa, as principais estações aparecem em maiúsculas.

Cheguei em Southampton Central com tempo de pegar o trem das 12:38, que chegaria em Salisbury às 13:10. Pedi um lanche na estação, só que demorou demais para esquentar e acabei perdendo esse trem.  No começo fiquei preocupado, porque chegaria em Salisbury somente às 13:40 (meia hora mais tarde). Mas, depois de olhar a papelada que imprimi percebi que os passeios para Stonehenge saem de hora em hora, sempre em hora cheia. Ou seja, teria um às 13, outro às 14, outro às 15, e assim por diante, até as 16 horas. No fundo, não ia adiantar em nada chegar às 13:10, ia esperar até às 14 do mesmo jeito.


Comi meu lanche, atento ao movimento da estação. Estava esfriando bastante (na verdade, ventando gelado), e minha mochila estava cheia de coisinhas que comprei em Winchester. Fiquei com receio de chover, mas no fim não caiu uma gota. A estação tem 4 plataformas, e comporta bastante movimento através de 6 trilhos. Para embarcar, era necessário prestar atenção ao lado da plataforma, se fosse no meio da estação (1, 2a, 2b, 3a, 3b ou 4). Uma passarela por cima de todas as plataformas interconectava as mesmas, e tinha um display eletrônico com todos os trens que iriam chegar nos próximos horários.

Ao embarcar no trem do meu horario, notei que tinha entrado nos vagões da primeira classe. Devagar, foi avançando pelo corredor até chegar no último vagão... e não tinha vagões diferentes. A formação inteira era de vagões de primeira classe. Fiquei encucado, porque minha passagem era "Standard". No fim não descobri se eu podia viajar ou não nesse trem, porque cheguei ao destino e ninguém me pediu a passagem. Também, não tinha visto nenhum anúncio que falasse que era só 1ra, portanto acho que não fiz nada errado.

Uma coisa que notei nesse trem era que estava bem lotado, e práticamente todos os assentos tinham um papelzinho encaixado no encosto. Tirei um para olhar, e falava RESERVED, junto com o nome da pessoa e o trecho. Com isso, me manquei que era possível reservar assento, porém não vi essa função nas máquinas automáticas. Em todas as viagens que fiz em UK, não reservei assento e comprei sempre nas máquinas.

Chegando em Salisbury, saí da estação e logo na esquina vi o ônibus de Stonehenge estacionado. Respirei aliviado, porque tudo estava dando certo.


Fui conversar com o motorista, perguntei onde comprava o ticket e no fim era tudo com ele mesmo. Confirmei que a saída fosse às 14, comprei meu ticket e voltei os 50 metros até a estação, para ver qualquer outro detalhe que pudesse interessar. Como dica de viajante, sempre tentem reparar em detalhes; observem as estações, o movimento das pessoas, procurem os caminhos, passarelas, máquinas de tickets, lanches e até banheiros.

Entrei no ônibus de dois andares, todo contente pela novidade. Esses ônibus são bem curiosos, e a gente vê tanto esses ônibus vermelhos nos filmes e seriados que é inevitável ficar curioso até entrar em um. Claro, subi a escada e fui no andar de cima, e estava quase vazio; somente tinha uma moça oriental em um dos bancos da frente. Sentei no outro banco, logo na primeira fila, para ter a visão mais panorâmica possível. Na foto ao lado, o andar de cima.

 O ônibus partiu no horário, e faz paradas na terminal de ônibus, depois em Old Sarum, e finalmente em Stonehenge. Como dica do motorista, visitei Stonehenge primeiro, e deixei Old Sarum para a volta. Todo o trajeto faz parte do "Stonehenge Tour", o que na propaganda deles é "a melhor maneira de visitar as pedras". Provavelmente, tenham razão. Com certeza é um jeito bem fácil e prático.



O ônibus vale como um modesto city tour, passando por algumas ruas bem estreitas, rodeado de prédios antigos e construções que viram passar um bocado de coisa. Não vou lembrar absolutamente nada do que a gravação do ônibus falou, mas cada esquina tinha uma história interessante. O velho mundo transpira por trás de cada tijolo dessa cidade. Na foto acima, A velha torre do relógio, remanescente da fundação de um castelo.



O casarão na foto acima já foi prefeitura, mansão e hoje cervejaria. Construções como estas aparecem em vários cenários, e fascinam pelo estilo tão típico.

Depois de um curto trecho, chegamos na estrada; estamos a menos de meia hora de Stonehenge. E aparece o primeiro sinal.


Estamos no caminho certo. No próximo post: Stonehenge.

Nas Terras do Rei Arthur - Parte 3

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Estou no trem, e finalmente a paisagem aparece na minha frente. Típicas casas inglesas, de tijolinho aparente e poucos andares, e telhados divididos para comportar a neve. E no fundo, quase sem perceber, vejo a bandeira do país e o London Eye, ficando acima de todos os prédios e construções. Sem saber ainda, eu me convenci de que se tiver o tempo passaria pelo London Eye na volta, já que não parece tão longe da estação de Waterloo. De fato, depois descobri que é bem perto, não mais de 10 minutos de caminhada. 


O trem seguiu seu curso. Para minha surpresa, o trem era fabricado pela Siemens, coisa que não esperava encontrar no Reino Unido. Pelo jeito, a Europa é bem mais globalizada do que eu pensava.
Vou aproveitar que estou no trem (quer dizer...  pensem que estou no trem) para mostrar dois endereços que são cruciais para planejar uma viagem pela Inglaterra. Tanto o trem quanto o metrô são maneiras bem rápidas e eficientes de se locomover para qualquer canto; no caso de outras cidades, ainda tem a opção do onibus, mas dependendo o horario pode ser até mais caro, e sem dúvida vai ser sempre mais lento.

O primeiro endereço é o da National Rail. Esse site é simplesmente perfeito, e consegue planejar todos os destinos e trocas de trem necessárias para chegar a qualquer lugar, falando todos os preços e horarios. Foi meu agente de viagens pessoal, para todas as situações. Tem também uns mapas fantásticos, como este aqui com todos os trens da região suleste. Eu usei a linha em vermelho para todas minhas aventuras.

O segundo link que quero mostrar é o do metrô de Londres, o "Tube". Na parte do Getting Around podem encontrar mais um monte de mapas, tanto do metrô como dos onibus, trams e balsas no Thames. É bem legal, e vale imprimir cada mapa e carregar na mochila.

Ok, enquanto distraía vocês com os sites, chegamos em Winchester. As paisagens que vi no trem foram lindíssimas, muitas plantações e bosques, muito verde intenso cortado por grandes florestas. Fica fácil entender de onde Tolkien tirou suas idéias para a Terra Media.

Uma curta caminhada pelas ruas de Winchester (perfeitamente sinalizadas) e chego no grande salão do castelo de Winchester, um dos maiores expoentes dos salões de século 13. 


Este salão pertence às gigantescas obras de reparação do castelo que fora do William o Conquistador (1066-1087), onde após os reparos ficou como grande salão  do conjunto de prédios do que faz parte hoje. Estes reparos aconteceram entre 1222 e 1235.

Entrei no salão, e chorei. Sério. Lá estava eu, dentro do grande salão do castelo, rodeado de pedras que viram séculos. Colunas massivas sustentando o teto. Vitrais maravilhosos, com os escudos de cada estirpe real. Portões de metal pesado, gigantes, reluzentes peças de metal retorcido. E lá, na parede,estava ela me esperando desde que falei pela primeira vez em 2007. A távola. 


Eu podia gastar mais palavras agora, mas para quem tiver curiosidades sobre a távola, suas origens outros detalhes peço para ver meu post de 2007, ou mesmo o site oficial do castelo de Winchester. Agora não tenho condição de falar sobre esses detalhes. Estou honestamente emocionado. 

Mais algumas fotos, para vocês sentirem o drama. Olha esses portões, e me digam se não são fugidos de algum livro do Tolkien. É tão Mordor...



A parede tem incontáveis nomes pintados, como se fosse uma grandiosa árvore genealógica. Olha só o tamanho das colunas:


As fotos mal conseguem mostrar o glorioso que é esse lugar. Mesmo vazio, impõe um respeito incrível. Para cada canto que se olhe, há alguma maravilha para se admirar. Olhem os vitrais.


E mais uma vez, a távola.


Que dizer... Es hermosa. No tengo palabras en otro idioma que describan lo que sentí.

Finalmente, me despedi da távola e do grande salão com a promessa de voltar. E deixei minha lembrança também, como não podia ser de outra maneira.


Ainda não foi para o livro, mas já está no blog. Na semana conto um pouco mais, subo algumas fotos no FB para que vejam, e os deixo com esse gostinho de quero mais para o próximo post. Voltei para a estação, embarquei para Southampton, e de lá para Salisbury. E para Stonehenge.

Até o próximo post!

Nas Terras do Rei Arthur - Parte 2

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Voltando a assunto, meu vôo saiu pontualmente às 16:15 no 3 de Abril, domingão. O vôo estava tranqüilo, com bom espaço gente que conseguiu deitar ocupando 4 poltronas lá no final do avião. Logo de cara olhei a programação de bordo, e assisti na telinha do assento "The King's Speech", que é um filmão. Detalhe: assisti sem legendas. Inglês británico de meados do século 20, com vocabulário extraordinário e pomposo, expressado na voz de um tartamudo. Era isso que precisava para abrir a cabeça e me preparar para o que vinha. Eu peguei corredor (como em toda viagem atlântica), e na janela vinha um carinha que falava mole. Bem apessoado até, mas falando mole. Duas possibilidades: ou estava bêbado, ou tomou alguma coisa para apagar no avião por cagaço de voar. O fato é que ficou com a janela aberta, um sol fortíssimo por cima das nuvens na cara, e dormindo, apagadaço. Logicamente, acordou por volta das duas da manhã, pilhado de tanto dormir, e ligou o notebook. Era um iMac com a tela estúpidamente brilhante. Ficou no Word (ou coisa parecida) escrevendo um monte, iluminando o avião inteiro com esse negócio, enquanto as pessoas tentavam dormir, do jeito que dava. E eu com esse refletor me apontando.

Tempo depois, parei de ouvir o teclado, mas a luz continuava. Virei para ver o que estava rolando; achei que o sujeito tinha dormido com a máquina aberta, mas aí vi o que era. iTunes. É. Qualquer pessoa normal ia optar por ouvir o som da rário do avião, ou usar o celular o mesmo qualquer player de bolso para ouvir músicas. Mas não; meu coleguinha de banco precisava um iTunes de 15 polegadas ligado no meio da noite para ouvir suas músiquinhas. Cansei, levantei, e fui bater papo com os comissários de bordo.

Eles, super gentis, me deram um bocado de dicas sobre a cidade, e lugares que podia visitar perto de Milton Keynes. No fim não visitei nenhum deles, mas para não esquecer do Dave vou dizer que era comissário británico muito simpático, e que era a cara do Matt Parkman (gordinho do Heroes que lê mentes), ou mesmo do piloto de avião que morre pelo Lostzilla. Bom que era só comissário e não piloto, senão ia me preocupar seriamente com o rumo do meu vôo.

Cheguei em Heathrow no terminal 5, descemos na pista, e fazia 10 graus. Clima bom, gosto desse friozinho de manhã. O onibus nos levou até o terminal, e lá que tomei um susto. Passando junto com os outros passageiros, um policial me segura firme pelo ombro e me puxa pra fora da fila. "F...deu", pensei.

Perguntas básicas, e eu nervoso pela fama da Inglaterra devolver gente. Respondi tudo com o melhor inglês que podia (que não é ruim, mas ficando nervoso custa pra sair). No fundo, acho que ia ficar nervoso respondendo em qualquer idioma mesmo. Subitamente, vieram duas palavras para minha mente, que foram a chave de passagem: "Bussiness Trip". Com isso fui liberado imediatamente, com um "Thank You for your cooperation, and sorry for any inconvenience" (Obrigado e desculpa qualquer coisa, viu?). Claro, a partir desse momento e até sair do aeroporto, nem respirava mais. Devia estar pálido, provavelmente. Coloquei o fone de ouvido, espetei no celular, e nem liguei o som. Fiquei mexendo no aparelho para pegar sinal de celular. Guardei no bolso. Pensava, "esse cara com certeza me marcou. Vão me deixar passar para me pegar depois. Vou me ferrar.". A fila andou, e chegou minha vez na imigração. Dei o sorriso mais cara de pau que dei na minha vida para a moça, junto com meu passaporte e um "good morning". Me perguntou as mesmas coisas, respondi de novo, "bussiness trip". Me perguntou onde ia ficar, e falei que ia passar um dia em Londres, e depois ia para Milton Keynes, onde era o "meeting". Quantos dias vou ficar, etc, etc, mais um par de perguntas, folhou o passaporte. Falando nisso, meu passaporte é horrível por ser feito no consulado, tem toda a cara de ser falso, mas por sorte já tem carimbos da Alemanha e França, e isso dá um pouco de credibilidade.

Finalmente, achou um espaço em branco (que não é para os vistos nem carimbos, é o espaço para renovações), e meteu o carimbão. Eu olhei o passaporte, agradeci e sai para buscar minha mala. Ufa.

Peguei a mala, e faltava passar pelo último controle. Uma japinha com um cachorro grande, não lembro o nome da raça mas é um cão de caça, do porte e tamanho de um Golden Retriever, só que com orelhas compridas como as de um Cocker Spaniel. Sempre aparece nos filmes quando caçam patos, ou até no joguinho do Duck Hunt.

O cachorro me cheirou, cheirou minha mala, e passei. Estava indo e voltei dois passos, para perguntar o nome do cachorro. Rocko. Cumprimentei o Rocko, e deixei ele me cheirar de novo, agora na amizade.

O aeroporto é gigante, e por sorte (ou experiência?) me orientei muito rápido. Achei o locker, que na verdade é um storage de bagagem pago (foi 8 libras por um periodo de 24 horas), onde escaneiam a mala e perguntam algumas coisas sobre os eletrônicos ou qualquer outra coisa que acharem durante o scan. Larguei os dois notebooks na mala grande, e fiquei somente com a mochila quase vazia, um caderninho, caneta, documentos, grana, as cameras de foto e o agasalho. O lance era viajar o mais leve possível, nada de ficar carregando coisas que não precisa.

Peguei um ticket de metro para as áreas 1 até 6 (sistema bem parecido ao da Alemanha), e fui até a grande estação de trens de Waterloo. Até então, tinha visto quase nada de Londres, fora trilhos e gente vestida quase que de qualquer jeito. Por sinal, gostei disso. Acho bom esse lance de cada um na sua, todos convivendo pacíficamente. Falando nisso, tinha dois tipos de pessoas: as que lêem revistas ou jornais, e as que escutam mp3. Para me enturmar, fiquei com o fone de ouvido na orelha, mesmo que desligado. Tinha um mundo novo de coisas para ouvir e aprender à minha frente, e não ia jogar isso fora.

Eram as 9:50, sai do metrô e segui as escadas até Waterloo Station. Esta estação é responsável pelo atendimento do sul/suleste do país, exatamente o rumo que pretendia seguir.  Fiz um par de perguntas de turista perdido nas cabines, e comprei meu ticket para Winchester.

O trem saiu exatamente às 10:05, e foi só então que comecei de fato a vislumbrar o país onde estava. E sorri. Estava na Inglaterra.

Daqui a pouco escrevo mais. Estou a caminho de Winchester.

Nas Terras do Rei Arthur - Parte 1

Finalmente e de forma completamente inesperada, o destino brincou ao meu favor e me vi com uma passagem para Inglaterra nas mãos. Me lembrei do Uthred, personagem principal das Crônicas Saxônicas de Bernard Corwell, contando como as fiandeiras do destino (as Norns) teciam as raizes de Yggdrasil, a árvore da Vida da mitologia nórdica. Segundo a mitologia nórdica, são elas que entrelaçam e desfazem os nós nas raizes de Yggdrasil, e assim a vida vai tomando rumos que nunca podemos prever, mas que estão escritos. 

Como várias outras vezes, surgiu a possibilidade de uma viagem para Alemanha, que foi se atrasando e atrasando por falta de hotéis e passagens. Tudo para um workshop, um encontro de trabalho com outras pessoas de vários paises. O fato é que por questões de agenda, acabaram marcando esse encontro a partir do 5 de Abril, com data para acabar no dia 8. Eu respirei aliviado, porque estava com receio de perder o show de U2, marcado para o dia 9 e com ingresso na mão fazia meses. O que não calculei e foi completamente inesperado foi a mudança do destino para Inglaterra, já que ficava mais fácil conseguir hotel e reservar para o evento. 

Quando soube, comecei a me apavorar. Será que eu ia viajar, ou colocariam outra pessoa? Será que aprovariam a viagem? O fato é que até quatro dias antes da viagem, eu não tinha a confirmação da minha ida, nem passagem, nem nada. Foi tudo às pressas. Detalhe: teria a segunda-feira livre, já que chegava em Londres na segunda-feira bem cedo, e o evento era só na terça, em outra cidade a uma hora de viagem. Assim, sabendo desse dia livre, comecei a bolar o plano mais ambicioso que se pode montar em apenas um dia. 
Então, a primeira pergunta que me fiz. Onde vou? O que posso fazer em um dia?

Sem conhecimento algum da geografia da Inglaterra, comecei a estudar o mapa, buscando lugares que lembrava da lenda arturiana, e ver quais as chances que teria de visitar os lugares. Isso envolve a logistica do transporte, a grana necessária, o tempo que pode levar para ir e voltar e ainda ver se o local estaria aberto. Então, a primeira coisa que fiz foi olhar na internet alguns mapas políticos da Inglaterra. E vi que é uma verdadeira bagunça.

Inglaterra é dividida mais ou menos em 80 condados. É isso mesmo, OITENTA. Imaginem decorar os estados do Brasil, ou as províncias da Argentina, só que no lugar das 20 e poucas são 80. Detalhe: comecei a dar zoom no mapa, e vi os nomes. Tinha um monte de Sei-Lá-O-Quê-Shire. Hamptonshire, Birminghamshire, shire, shire, shire. Vou me perder como um otário, pensei. Aí afastei o mapa, e procurei primeiro Londres (no meio do reino, um pouco para abaixo), e procurei Milton Keynes, a cidade onde ia passar os dias do workshop. Milton Keynes fica bem no meio, em uma divisão do mapa que se chama oportunamente de Midlands (terras do meio, ehem..). Ao pesquisar sobre Milton Keynes, descobri que era uma cidade bem nova, fundada em 1971 e inspirada na americaníssima Los Angeles. Ou seja, nada nem remotamente histórico na cidade, nem realmente inglês (salvo a mão das ruas, que é bem perturbador para quem está habituado com vías na mão direita).  

Assim, comecei a pensar... Deixa ver... Onde posso ir? Ou melhor, onde gostaria de ir? O que quero visitar? O que é genuinamente arturiano?

A primeira cidade que me veio à mente foi Glastonbury. Glastobury é fundamental na lenda por ser o lugar de descanso final de Arthur; embora a lenda diga que foi em Avalon, há razões para pensar que Avalon na verdade seja uma região de terra que eventualmente fica ilhada por causa da maré, enquanto em outros momentos fica rodeada por terra por todos os lados. É uma ótima maneira de disfarçar uma ilha... O lance é que Glastonbury e sua catedral (hoje em ruinas) é o lugar onde foi achado um painel falando que era o túmulo de Arthur e Guinevere, e alguns metros abaixo desse painel foram achados dois corpos enterrados, de um homem e uma mulher. Estes corpos sumiram em determinado momento, mas até hoje tem visitantes que levam flores às ruinas, onde resta uma pequena placa com o nome do lendário rei. Só tinha um problema: Glastonbury é longe demais de Londres, e fica completamente fora de mão. 

Mudando de idéia, lembrei de Tintagel. Já que não poderia ver onde terminou a vida de Arthur, por quê não ver onde nasceu? Tintagel era o castelo a beira-mar do Gorlois, marido da Elaine que posteriormente viria a se tornar mãe de Arthur, filho de Uther Pendragon. Gorlois foi morto por Uther, e através de um feitiço do Merlin Uther tomou a aparência de Gorlois, e entrou não somente no castelo de Tintagel, como acabou entrando na cama de Gorlois e engravidou a Elaine. Tudo isto não foi apenas obra do acaso, mas um elaborado plano do Merlin. Essa criança não cresceria ao lado dos pais, mas seria levado para longe, onde seria descoberto como verdadeiro e único rei quando fosse o momento certo. Esse momento foi revelado com a clássica cena da Espada na Pedra. Então, Tintagel parece uma ótima opção, salvo por um detalhe: é ainda mais longe do que Glastonbury, afinal, é beira-mar, né?
Enquanto ia desanimando e perdendo as esperanças, senti um calafrio intenso, e uma faísca de memória estalou na cabeça. Inglaterra. Estou indo para Inglaterra. Terra antiga, envolta em brumas e mistérios. Fervilhando de lendas e lugares épicos. E entre eles, um dos maiores mistérios, não resolvido até hoje, e que provavelmente fique sem resposta até o fim dos dias. Stonehenge.

Comecei a pesquisar. Horários, cidades, transportes. E descobri, já radiante de alegria, que Stonehenge fica em Salisbury, apenas a duas horas de trem de Londres. Vitória. Finalmente tinha um destino.

Como um turbilhão, outra memória veio à cabeça, e comecei a pesquisar no blog. Encontrei o que buscava e, para meu fascínio, ficava na cidade de Winchester. Onde fica Winchester? Exatamente a metade de caminho entre Londres e Salisbury. E eu tinha um plano nas mãos.

Busquei mais informações, pesquisei trens, horários, combinações, e tudo foi se encaixando. Fui meu melhor agente de viagens. Tudo funcionou à perfeição, tudo conforme ou até melhor do que esperado. Tudo o que me propus a fazer, fiz. E um pequeno diário de viagem registrou cada momento, junto com a câmera de fotos, que não saiu do meu bolso nessa longa e intensa segunda-feira.

Esse caderninho me acompanhou em cada trem, em cada parada, e tem nele cada palavra. É o primeiro registro de cada emoção, de cada experiência vivida nessa viagem.

Mas, o que tinha em Winchester? Conto no próximo post.